A legitimidade de parte no contrato e a obra de José Veiga
Todo e qualquer negócio jurídico requer para a sua validade o preenchimento de determinados requisitos : a capacidade do agente, a legitimidade, o objeto lícito e possível, determinado ou determinável, a forma, quando prescrita em lei, e a causa, salvo quanto a esta nos chamados negócios abstratos (acordo de transmissão de propriedade, títulos ao portador, negócios jurídicos cambiais ou cambiariformes).
Carnellutti foi um dos primeiros a demonstrar que não basta a capacidade do agente, pois é preciso que ele tenha legitimidade para a prática do ato jurídico ou, noutros termos, que o sujeito guarde uma posição idônea em relação ao objeto do contrato.
A legitimidade para a realização de atos jurídicos, especialmente dos contratos, pode ser tanto um requisito de validade como um fator de eficácia. É requisito de validade sempre que a lei impede algumas pessoas de praticar determinados atos jurídicos. Não atendido o requisito, o ato pode restar nulo ou anulável, como, por exemplo, se houver a venda de bens a descendentes sem o consentimento do cônjuge e dos demais descendentes. Portanto, é o consentimento do cônjuge ou dos descendentes não contemplados que legitima a venda (Código Civil, art. 496). Outro exemplo é o da invalidade do ato por falta de autorização do outro cônjuge para alienar ou gravar de ônus reais os bens imóveis, ou para pleitear como autor ou réu acerca desses bens, doar bens comuns, prestar fiança ou aval (Código Civil, art. 1.647). Trata-se em todos esses casos, de legitimidade sob o aspecto negativo.
Por outro lado, a legitimidade pode ser fator de eficácia do contrato, sempre que o agente praticar ato jurídico encontrando-se na titularidade de um poder, como na hipótese do proprietário que aliena ou grava bens de sua propriedade, ou quando um representante que recebe poderes para venda e aliena o bem. Diz-se então nesse caso que se trata de legitimidade sob o aspecto positivo, porque a norma jurídica impõe a observância de alguns itens para a realização do contrato.
Na sua tese de doutorado na Faculdade de Direito do Recife, intitulada Da legitimidade de parte no contrato - agora em edição renovada e bem atualizada pelo neto Guilherme Veiga - o saudoso Prof. José Veiga dissertou com mestria sobre as mais diferentes situações da legitimidade nos contratos, as quais até aos fins do século XIX não mereciam atenção dos doutrinadores e eram em geral confundidas com a capacidade do agente.
Mostrou com clareza o referido autor que a legitimidade não é matéria de livre apreciação do sujeito, porque só o ordenamento jurídico pode qualificar e estruturar a legitimidade do contratante. E ao final sintetiza José Veiga, entre outras conclusões, que a legitimidade é inerente a todo e qualquer contrato e diz respeito a ambas as partes, podendo a lei considerá-la tanto como requisito de validade, como fator de eficácia.
-----------------
Os artigos publicados nesta seção não refletem necessariamente a opinião do jornal. Os textos para este espaço devem ser enviados para o e-mail [email protected] e am por uma curadoria antes da aprovação para publicação.