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Um Ponto de vista do Marco Zero

Amazônia: centro mundial de fármacos e estética. Ou um arrabalde?

O país, em mais de quinhentos anos, não pensou a Amazônia. Estrategicamente

Em 2019, fomos, grupo de professores, a Belém. Visitar instituições, ver melhor a Região. Porque, no fundo, nós não conhecemos a Amazônia. Eu já tinha ido ao Amazonas e ao Pará, a trabalho, como coordenador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU, do Ministério do Interior. Mas, nunca tinha penetrado a floresta. Foi o que fizemos naquele ano. De barco.

Um local chamado Alter do Chão. Adentrar a mata é um deslumbre. Porque trata-se de lugar próprio. Planeta específico. Coberto de árvores e silêncio. Aqui e ali, um silvo. Um eco. No mais, um grande colchão verde. Silencioso. Como se o ambiente, qual rio natural, ritual, impusesse respeito. Reverência. Referência. Na entrada, poucas moradias. Feitio equatorial. Comer, numa mercearia especializada em culinária do lugar, é privilégio. Pela harmonia do cenário, pelo acolhimento.

Com a proximidade da COP 30, Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, li Arrabalde (Companhia das Letras, São Paulo, 2022), de João Moreira Sales. Numa época em que as coisas se organizam em torno do conhecimento (e não de indiferença), a Amazônia é um desperdício. De recursos. E de oportunidades. Trata-se da maior biodiversidade do mundo. Senão intocada, em processo de destruição.

A Amazônia legal engloba nove estados. Corresponde a 58,9% (mais da metade) do território nacional. Dos vinte municípios com maior IDH do país, nenhum se encontra lá. Considerando a população empregada na agropecuária, 60% trabalham na pecuária, 34% na agricultura e apenas 5,4% na produção florestal.

A dinâmica do desmatamento registra que, primeiro, chegam os madeireiros. Depois, são feitas as queimadas. E, em seguida, chegam os bois. A diferença de preço entre a terra abundante na Amazônia e a estepe sudestina explica a migração. Quando a riqueza do solo se esgota, nitrogênio, fósforo, potássio, a fronteira avança. É um ciclo de extinção. Apoiado por políticas públicas. Que oferecem incentivo fiscal, crédito agrícola e ocupação fundiária. Não há lucidez. E, por isso, não existe desenvolvimento sustentável.

Não se definiu, até hoje, um modelo de ecodesenvolvimento para a Amazônia. Ambientalmente sustentável. O país, em mais de quinhentos anos, não pensou a Amazônia. Estrategicamente. Como uma oferta. Um espaço para aplicar chances de equilíbrio social. As intervenções são aleatórias. Rodoviárias, no obscurantismo. E episódicas, no eleitoralismo. Quem vai para a Amazônia, está pensando em substituir (falsificar) a floresta.

A Amazônia é vazia. Na governança. O que surgiu foi uma moda sertaneja. Hábitos. Modos de enxergar a realidade. Como escreve João Moreira Sales: “Jovens e velhos, modernos e arcaicos, ricos e pobres, liberais e conservadores, além dos reacionários. Cultura hegemônica que vitoriosos impam à Amazônia. Cabines duplas, adereços taurinos, rodeios” (pg. 201). Planejamento estratégico? Nada.

Na verdade, a Amazônia é uma oportunidade rara de investimento. Para instalar um polo mundial de fármacos. A partir dos recursos naturais da região. Já se faz isso. No varejo. Sem visão planejada. Nem articulação institucional. A Natura, por exemplo, trabalha lá. E esta é outra dimensão das imensas possibilidades produtivas da Amazônia: um centro internacional de estética. De produtos de beleza. Com base nos elementos da natureza existentes na área.

Cerca de 22 milhões de brasileiros vivem na Amazônia. A Índia tem 1,2 bilhão de habitantes. A Amazônia tem território maior que o país asiático. É bioma que vai cumprir seu destino nacional. E sua vocação civilizatória. Porque a Amazônia é sonho tropical, feito de biodiversidade única. É cenário cinematográfico, onde o rio engole verdes da floresta e devolve arrebol rubro de beleza incomparável. É desafio épico, no qual a sofisticação da ciência encontra saída para a vida do homem. E não para a morte da inteligência.       

    

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